Algo muito estranho emerge, pois, da revolução gödeliana: a revelação do poder causal do significado num universo regulamentado mas livre de significados. E é aqui que a minha analogia com cérebros e egos regressa, sugerindo que a volta retorcida da consciência de si mesmo presa dentro de um bolbo inanimado chamado «cérebro» também possui poder causal — ou, de outro modo, que um mero padrão chamado «eu» pode remexer no meio de partículas inanimadas no cérebro não menos do que as partículas inanimadas no cérebro podem remexer nos padrões. Para abreviar, um «eu» assume-se — pelo menos do meu ponto de vista - através de uma espécie de um vórtice mediante o qual os padrões no cérebro reflectem o espelhar cerebral do mundo e, mais tarde ou mais cedo, espelham-se a si próprios e, no seguimento, o vórtice do «eu» torna-se uma entidade real, causal. Para uma vívida analogia concreta, embora imperfeita, deste curioso fenómeno abstracto, pensemos no que acontece quando uma câmara de TV é apontada a um televisor de modo a exibir-se a si própria no ecrã (e o ecrã no ecrã, etc.) — aquilo a que chamo em GEB «televisão autodevoradora» e em escritos posteriores, por vezes, chamo «circuito de realimentação com passagem de nível» (level-crossing feedback loop). Quando e somente quando tal volta ocorre num cérebro ou em qualquer outro substrato é que uma pessoa — um único «eu» novo — é trazida à existência. Além disso, quanto mais auto-referencialmente rica uma tal volta é, mais consciente é o ego a que dá origem. Sim, por muito chocante que isto possa parecer, a consciência não é um fenómeno apaga-acende, mas admite graus, graduações, tonalidades. Ou, para ser mais directo, há almas maiores e almas mais pequenas.