[September 15th, 2024: This was read long ago — more than three years ago! ouch. — way before kobogarden was a thing — and it was written in Portuguese, no less, on an older platform of mine.
I quote it in full so that one sees I was already very pretentious back then for nostalgia sake. But it was a pleasant surprise to see that one of my most cherished ideas about programming — that making code is like producing a work out of clay — came from this book.]
Sobre Hackers & Painters, um livro de Paul Graham. đź“š
SĂŁo agora vinte e duas horas e quarenta e trĂŞs minutos da noite de dois de Agosto de dois mil e vinte e um.
Ditou a circunstância da viagem a Bragança que me imaginasse rodeado de altas árvores e chilreios; alheado do mundo, da Internet, das notĂcias e do bulĂcio, e acompanhado apenas de livros, pois claro - nestas ocasiões, preparo um considerável acervo que pretendo capaz de cobrir todo o possĂvel desejo: vai poesia - O Livro da Pobreza e da Morte, de Rilke -, e vai ficção - a releitura d'A Montanha Mágica, do amigo Thomas Mann, que muito me marcou na adolescĂŞncia -; e houve espaço para os contos - recuperei, apĂłs extravio por emprĂ©stimo (por sinal, a quem a obra em nada impressionou), as existencialmente entusiasmantes Ficções, de Borges.
Faz parte deste ritual de retiro lançar mão de outras tantas obras que julgo promissoras. Na intersecção dos meus interesses por tecnologia, programação, e pequenos ensaios, chegou-me Hackers and Painters: Big Ideas from the Computer Age, colectânea de alguns artigos e escritos de Paul Graham ("English-born American computer scientist, essayist, entrepreneur, venture capitalist, and author.", pela Wikipedia), lançado originalmente em 2004. Graham é uma incontornável figura do ciber-espaço, chamemos-lhe assim, e é um conhecido entusiasta da linguagem Lisp: para leigos, digamos que é um fascinante e pouco ortodoxo microcosmos intelectual, habitado pelos mais astutos programadores e plataforma de ideias poderosas e radicais; não há, necessariamente, uma enorme procura no mercado, mas é um paradigma que parece modelar em qualquer programador um ideal de elegância da forma (a minha derradeira tentativa numa boa analogia: C e Java são futebol e basquetebol, respectivamente; Lisp é algo como Yoga, ou Pilates). Deste tipo de literatura, cujo propósito está circunscrito entre o prazer e a funcionalidade, espera-se algumas ideias - e úteis. Serve a presente nota para apregoar não só o cumprimento desse propósito basilar, como fazer ponto da singularidade do seu conteúdo, em igual medida interessante, entusiasmante, e inspirador.
O nome do livro herda o tema de um dos ensaios, onde se tecem comparações entre a arte da pintura e o ofĂcio da programação; foi especialmente iluminadora a ideia de um programa ser análogo a olaria: o cĂłdigo vai surgindo, e a ideia, aos poucos, revela-se; quase como se o objecto Ăşltimo de cada empreitada fosse chegar Ă forma platĂłnica (e nĂŁo o Ă©, de certa forma?). Durante anos a fio me frustrou ver, na Matemática, a forma final, a forma pura - e saber-me incapaz de a reproduzir -, e Ă© um alĂvio, ou uma tremenda satisfação, ver reconhecido o processo de criação na feitura de cĂłdigo.
Há outros temas, maioritariamente ligados Ă tecnologia e Ă informática (apesar de certos outliers, como a análise mordaz e divertida da estrutura social subjacente ao tĂpico universo escular encetada no primeiro capĂtulo - acaba por ser uma introdução leviana do que Ă© o geek, ou um breve estudo das moral fashions, no capĂtulo What You Can't Say — 2004, certo? Politicamente correcto before it was cool), mas vários momentos sĂŁo dedicados ao mercado de trabalho, Ă filosofia das start-ups, a considerações sobre a produção de riqueza. Graham pensa várias das questões de uma forma holĂstica, e quase todos os ensaios sĂŁo exemplos da clarividĂŞncia que resulta quando se alia, num dado momento, o raciocĂnio lĂłgico (talvez cientĂfico) ao gosto pela palavra. Há algumas analogias empregues por Paul sobremaneira elegantes e sucintas: sobre as maravilhas de server-based software, por exemplo,
As a general rule, you do know what's happening inside it. You don't have the source code memorized, of course, but when you read the source you do it like a pilot scanning the instrument panel, not like a detective trying to solve a mistery.
capĂtulo 5.4
Arrisco recomendar, no mĂnimo, a leitura do Ăndice em busca de assuntos de interesse a (qualquer) leitor. Para quem, como eu, está enquadrado em todo este turbilhĂŁo tecnolĂłgico-matemático, esta Ă© uma obra que sacia o espĂrito curioso, abre portas para exploração futura, e valida o árduo e bizarro caminho da programação. Por outro lado, acaba por ser um documento que ajuda a definir, numa ingĂ©nua perspectiva antropolĂłgica, uma geração de pessoas que trabalha com software, elucidando as suas motivações, mĂ©todos, e atĂ© algumas das consequĂŞncias do seu trabalho e estilo de vida. Pois seria ingĂ©nuo da parte de todos nĂłs (ou vĂłs...) achar que nĂŁo serĂŁo os geeks a dominar o mundo nas prĂłximas gerações.
Title | Hackers & Painters |
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Author | Paul Graham |
Publisher | O'Reilly Media |